quinta-feira, 21 de maio de 2009

Ano(s) Zero

No inicio da época que finda, fiquei satisfeito por ouvir os dirigentes do nosso Benfica dizerem que agora iriam montar um projecto a médio prazo e que este constituía o ano zero. Logo na altura achei que com o plantel que tínhamos as possibilidades eram boas, pois genericamente estávamos bem servidos. Considerei na altura, e mantenho a mesma consideração, que o erro que existiu na formação e construção do plantel se situava nas laterais, na definição da táctica/modelo de jogo e no treinador. Vou deixar as laterais para outras lides e focar-me naqueles que considero serem os pontos mais importantes do nosso não sucesso.

Vou começar por Quique. Não sendo um treinador com currículo, é um treinador novo e moderno, com vontade de trabalhar e uma postura invejável para a generalidade dos treinadores da nossa Liga. É correcto, e sabe estar, o que é de louvar. Não conhecia o futebol português, mas isso aprende-se. Possuí no entanto um handicap que nunca poderá ultrapassar. É estrangeiro. Não defendo nacionalismos exacerbados, nem sequer nacionalismos ligeiros, mas para um projecto a médio/longo prazo, um treinador estrangeiro nunca servirá porque ao primeiro sucesso quererá dar o salto para uma liga mais competitiva e o projecto ficará coxo, por isso não concordo com Camachos, Erikssons e muito menos Scolaris. Relativamente à táctica escolhida por Quique, ou modelo de jogo, o 4-4-2 puro parece-me demasiado fácil de contrariar se não for bem montado e interpretado por todos os elementos, e isso viu-se que não foi atingido.

Por outro lado, considero que num projecto bem construído se deveria seguir o exemplo do Sporting. Em boa verdade, o grande sucesso dos nossos rivais da 2ª circular não é terem os melhores jogadores na Academia. É verdade que por lá passaram Figo, Simão, Quaresma e Cristiano Ronaldo, mas o facto de desde os escalões de formação todas as equipas jogarem no modelo de jogo dos seniores, facilita de sobremaneira a integração dos jovens valores no plantel principal, uma vez que quando atingem a maturação já sabem o que tem que fazer e por isso jogadores “jeitosos” entram facilmente na equipa principal. Ora no nosso Benfica, basta assistir a um jogo dos juniores para se perceber que os jogadores, sendo bons, não sabem o que andam a fazer em campo, e com a agravante de jogarem de forma diferente dos seniores.

Assim, é lógico defender a ideia, que qualquer modelo de jogo que venha a ser implementado, seja este composto por losangos, quadrados ou rectângulos, o que verdadeiramente importa é que este constitua a filosofia de jogo do clube em toda a sua dimensão. Depois podemos argumentar que o melhor é jogar em 3-5-2, 4-2-3-1, 4-3-3 em 4-4-2 ou qualquer outra conjugação numérica.

Aqui o Director Desportivo tem que ter uma palavra a dizer, pois a ele corresponde esta responsabilidade.

Em primeiro lugar, deve ser conhecedor do futebol e das tendências da evolução do jogo, e depois, deve escolher os treinadores que melhor interpretem o modelo de jogo definido, em qualquer que seja o escalão de formação, mas a premissa fundamental é que todos joguem assim. Basta lembrar o que Queiróz fez com a nossa selecção, em que pegou nos “miúdos” que foram campeões em Riade e Lisboa, e construiu a base de uma selecção que ainda hoje mantém o mesmo modelo de jogo.

Vejamos um pequeno exemplo na nossa casa relativo aos últimos anos.

Ronald Koeman chegou e procurou que a equipa jogasse em 3-5-2, falhou porque não teve coragem de manter as suas ideias e cedeu perante a pressão da comunicação social e dos sócios. Fernando Santos, que sempre vi jogar em 4-3-3 até chegar ao nosso Benfica, quando deu a conferência de imprensa de apresentação anunciou que iria jogar em 4-4-2 com o famoso losango, como a equipa vinha do ano anterior e o plantel em que pegou não tinham características para este modelo, fracassou. Camanho, não sabia bem como jogar, e tendo um plantel construído por Fernando Santos optou por jogar em 4-2-3-1 com os resultados que conhecemos. Quique Flores trouxe-nos depois a versão mais conhecida do 4-4-2, mas nunca teve extremos puros, e se os teve não os usou. Em 4 (quatro) anos, não falando no número de treinadores, conto pelo menos 4 modelos de jogo, 4 esquemas tácticos e 4 filosofias de jogo, e resolvi ignorar as transformações que foram sendo operadas a meio das épocas.

O que se passou entretanto nos escalões de formação? Absolutamente nada que produza resultados. Podemos argumentar que entretanto conseguimos ser campeões de juniores, juvenis, iniciados e infantis, mas servirá isso os intentos do nosso Benfica se de nada serve à equipa principal os resultados obtidos pela sua “cantera”? Parece-me óbvio que enquanto Clube é óptimo ter estes troféus. Mas e enquanto SAD? Qual é a rentabilidade que retiramos dos investimentos?

Olhamos para o lado, e vemos os nossos rivais, com planteis mais fracos, com menos recursos e com menos meios, a ficarem novamente à nossa frente. E porquê? Metade da equipa é composta por jogadores “jeitosos” que não têm lugar nem no nosso Benfica nem no Porto, mas sabem o que tem que fazer.

Por vezes, dou comigo a pensar nos jogadores que poderíamos ter se investíssemos da mesma forma. De que nos vale gastar 1,5 milhões num qualquer Chicão, se temos o Miguel Vítor? Não valerá mais ter 3 ou 4 meninos como ele, e manter o Luisão? Não poderíamos contratar um parceiro consagrado ao invés de “gastarmos” 3 milhões em cada Anderson, André Luiz e Argel, para depois os dispensarmos? Ainda assim, não será preferível ir buscar o Valdomiro ao Trofense por 300 Mil Euros? De que nos vale pagar o ordenado principesco de Reyes, Miccoli e Suazo, se tivemos que vender o Simão? Não fariam o André Carvalhas ou o David Simão o mesmo papel se tivessem sido “programados” para o modelo de jogo da nossa equipa? Não será preferível manter o Cardozo e promover o Nélson Oliveira para jogar a seu lado? É disto que falo. Porque continuamos a olhar para a frente mas não vemos ao fundo, e assim continuaremos enquanto se servirem do nosso Benfica para promoção pessoal e para granjearem notoriedade fácil e a curto prazo. Não parece difícil, mas é preciso seriedade e honestidade.

Garanto que com os milhões que se poupam nas contratações às cegas e nas passagens para a América do Sul, podíamos pagar o ordenado do Simão, do Tiago, do Jorge Andrade, do Hugo Almeida, do Danny, do Meira, do Ricardo Carvalho e se calhar até dava para a cláusula de rescisão do Moutinho.

Pergunto: Quantos mais anos zero vamos precisar?

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